Por 8 votos a 2, o Supremo Tribunal Federal (STF)
suspendeu o uso do voto impresso nas urnas eletrônicas nas eleições de outubro
deste ano. A decisão foi tomada nesta quarta-feira (6) a partir de uma ação da
Procuradoria-Geral da República (PGR) contra a impressão, sob a alegação de
violação do sigilo do voto.
A impressão do voto foi criada em 2015, pela
minirreforma eleitoral, com objetivo de garantir meios para embasar auditorias
nas urnas eletrônicas. Mesmo com a garantia da Justiça Eleitoral de que o
sistema de votação é seguro, questionamentos de alguns eleitores levaram o
Congresso Nacional a criar o voto impresso.
Apesar de ser chamado de voto impresso, o mecanismo
serve somente para auditoria das urnas eletrônicas, e o eleitor não fica com o
comprovante da votação.
Ao entrar na cabine, o eleitor digitaria o número de
seu candidato na urna eletrônica. Em
seguida, um comprovante para conferência apareceria no visor da urna. Se a
opção estivesse correta, o eleitor confirmaria o voto, e a impressão seria
direcionada para uma caixa lacrada, a ser analisada posteriormente pela Justiça
Eleitoral. A fiscalização confirmaria, então, se os votos computados batem com
os impressos.
No início do ano, o Tribunal Superior Eleitoral
(TSE) chegou a fazer uma licitação para instalar impressoras em 30 mil urnas
eletrônicas, o que representaria 5% do total, mas a compra foi suspensa. O
contrato seria de aproximadamente R$ 60 milhões. Com a decisão, o presidente do TSE e ministro
do STF, Luiz Fux, informou que a licitação será revogada. Fux estava impedido
de participar do julgamento.
Julgamento
Relator da ação da PGR, Gilmar Mendes votou pela
manutenção do voto impresso, mas entendeu que a impressão deve ser implementada
pela Justiça Eleitoral conforme a disponibilidade de recursos. Em seu voto, o
ministro também criticou pessoas que contestam a segurança e confiabilidade das
urnas eletrônicas. O entendimento foi acompanhado por Dias Toffoli.
“Há uma ideia de que a votação, toda ela, no Brasil,
é fraudada, e que o eleitor vai ter o voto impresso e vai levar para casa. Vai
colocar no bolso e levar para casa. Daqui a pouco, farão uma apuração
particular. Vende-se um tipo de ilusão. Beira ou já ultrapassou os limites do
ridículo”,afirmou.
A divergência foi aberta pelo ministro Alexandre de
Moraes, que votou contra a norma que criou o voto impresso por entender que a
medida compromete a confidencialidade do voto. Segundo Moraeso, a impressão
permite a possibilidade de identificação do eleitor, podendo causar pressão
indevida para que o cidadão vote em favor de alguém.
"Se será impresso alguma coisa para fazer a conferência,
alguém vai ter que colocar esse voto impresso em algum lugar, vai poder ter
conhecimento desse voto impresso.", argumentou Moraes.
Luís Roberto Barroso, que também votou contra a
impressão, disse que não há evidência de fraude que justifique a implantação do
voto impresso. Barroso argumentou que também inviabilizam o voto impresso o
alto custo de implementação, de aproximadamente de R$ 2 bilhões, e o risco da
quebra de sigilo.
"Os controles atualmente existentes são
suficientes, não envolvem custos elevados. Nada documenta que tenha ocorrido
quebra da segurança ou que tenha ocorrido fraude", acrescentou Barroso.
A presidente do STF, Cármen Lúcia, também reforçou
que não há indícios de fraude que justifiquem o uso do voto impresso, que
poderia quebrar o sigilo. "É preciso que a gente aprenda a confiar nas
instituições brasileiras, especialmente nas que dão certo, e a Justiça
Eleitoral tem dado certo. O processo de voto eletrônico e da urna eletrônica
tem dado certo”, afirmou.
O entendimento contra a impressão também foi
acompanhado pelos ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Marco Aurélio, Ricardo
Lewandowski e Celso de Mello.
Suspeitas
de fraude
O advogado Alberto Emanuel Malta, representante do
Sindicato dos Nacional dos Peritos Criminais Federais, defendeu, durante o
julgamento, o uso do voto do impresso para aprimorar a segurança da votação.
Durante sua sustentação, Malta disse que peritos que participaram de testes de
segurança promovidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2017 conseguiram
violar o programa da urna eletrônica.
"Esses profissionais conseguiram encontrar
diversos vícios, diversas falhas, no sistema eletrônico de votação. A título de
exemplo, conseguiram esses profissionais gerar boletim de urna falso,
conseguiram obter a chave criptográfica da urna. Conseguiram ainda, o que é
mais grave, alterar a ordem do RDV, que é o registro digital do voto, o que
garante o sigilo do voto e, portanto, conseguiram identificar quem era o
primeiro, o segundo e o terceiro voto de cada um dos eleitores", afirmou
Malta.
A afirmação causou desconforto aos ministros Luiz
Fux, atual presidente do TSE, e Ricardo Lewandowski e Cármen Lucia, que já
presidiram a Corte Eleitoral. "Essa é uma imputação muito séria",
afirmou Lewandowski. Em seguida, Cármen Lúcia emendou: “Muito séria. E da maior
gravidade."
Procuradoria
Ao se manifestar no julgamento, a procuradora-geral
da República, Raquel Dodge, reforçou a tese de que o voto impresso é um
mecanismo de impressão automatizada somente para fins de fiscalização, que não
contribui para efetivar a vontade do eleitor, porque o voto não é preenchido
por ele, como nas antigas urnas de lona.
Segundo a procuradora, a norma também não previu as
consequências em caso da constatação de divergência entre o voto computado e o
impresso, como a eventual anulação do voto. "Essas ponderações me levaram
a trazer ao plenário desta Corte considerações sobre a persistência de riscos à
segurança jurídica, à confiabilidade do voto eletrônico, à prevenção de fraude
na transmissão do voto eletrônico, que será verdadeiramente computado",
afirmou.